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Servidor público: contribuição previdenciária sobre parcelas não incorporáveis aos proventos

27/07/2015, publicado por

O Plenário retomou julgamento de recurso extraordinário em que discutido se haveria incidência de contribuição previdenciária sobre terço de férias e adicionais por serviços extraordinários e por insalubridade. Na espécie, servidora pública federal pretendera impedir a União de efetuar descontos previdenciários sobre aquelas verbas, bem como quaisquer outras de caráter transitório que viesse a receber, haja vista a impossibilidade de incorporá-las aos proventos de aposentadoria — v. Informativo 776. Em voto-vista, o Ministro Luiz Fux acompanhou o Ministro Roberto Barroso (relator), para prover parcialmente o recurso. Destacou a convergência, no âmbito constitucional, entre o Regime Geral de Previdência Social – RGPS e o Regime Próprio de Previdência Social – RPPS. Anotou que, antes das alterações constitucionais em debate, a jurisprudência do STF seria no sentido de que a contribuição previdenciária de servidor público não poderia incidir sobre parcelas não computadas para o cálculo dos benefícios de aposentadoria, tendo em conta que: a) a natureza indenizatória dessas parcelas não se amoldaria ao conceito de remuneração; e b) essas parcelas não seriam incorporáveis aos proventos dos servidores, o que levaria à desconsideração da dimensão contributiva do RPPS. Uma vez existirem controvérsias quanto à natureza das parcelas, remanesceria o segundo argumento. No ponto, o RPPS teria migrado, da redação originária do texto constitucional, de natureza solidária e distributiva, para um regime de natureza também contributiva (EC 3/1993). Posteriormente, com a entrada em vigor da EC 20/1998, o aspecto contributivo fora reforçado, colocando em aparente conflito os princípios da contributividade e da solidariedade. A EC 41/2003, por sua vez, reforçara o caráter solidário do sistema, mas não derrogara o seu caráter contributivo. Afirmou que a aplicação do princípio da solidariedade afastaria relação sinalagmática e simétrica entre contribuição e benefício. Contudo, o princípio contributivo impediria a cobrança de contribuição previdenciária sem que se conferisse ao segurado qualquer contraprestação, efetiva ou potencial, em termos de serviços ou benefícios. Além disso, com o advento da EC 41/2003, o fortalecimento de algumas regras de capitalização coletiva não poderia desvirtuar a intenção do constituinte de fazer incidir contribuição apenas sobre parcelas cujo proveito ao beneficiário fosse possível em alguma medida. Se o Estado buscasse fortalecimento atuarial, poderia agravar alíquota incidente sobre os participantes ou até aumentar sua participação no custeio, mas não poderia haver tributação sobre base não imponível, em arrepio ao postulado da solidariedade. Nesse sentido, a referibilidade entre remuneração e contribuição seria confirmada pela interpretação sistemática dos §§ 2º e 3º do art. 40, c/c o art. 201, todos da CF. Nesse aspecto, seria também expressa a nova redação do art. 4º, § 1º, da Lei 10.887/2004, dada pela Lei 12.688/2012, a inserir os incisos X a XIX, para afastar da base de cálculo da contribuição previdenciária dos servidores públicos o adicional de férias, de serviço extraordinário e de serviço noturno, típicas parcelas não incorporáveis aos proventos de aposentadoria. Por essa razão, a jurisprudência da Corte estaria estruturada na natureza das verbas, e não na existência de previsão legal para a sua exclusão, com o fim de fixar a não-incidência das contribuições. Assim, as exclusões não seriam taxativas. Portanto, o princípio estrutural da solidariedade, em substituição à solidariedade de grupo, deslocaria o fundamento das contribuições sociais do princípio do custo-benefício para o da capacidade contributiva. Nesse diapasão, ainda que o princípio da solidariedade fosse pedra angular do sistema dos servidores, não poderia esvaziar o conteúdo do princípio contributivo, informado pelo princípio do custo-benefício, tendo em conta a necessidade de um sinalagma mínimo, ainda que não importasse em perfeita simetria entre o que se paga e o que se recebe.

Servidor público: contribuição previdenciária sobre parcelas não incorporáveis aos proventos – 5

Por sua vez, o Ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência, para desprover o recurso. Aduziu que o rol exemplificativo do art. 4º das Leis 9.783/1999 e 10.884/2004 deveria ser interpretado no sentido da possibilidade de se incluírem na base de cálculo das contribuições previdenciárias, independentemente da repercussão direta e imediata do valor do benefício, parcelas remuneratórias recebidas pelos servidores a título de ganhos habituais, excluindo-se, portanto, os ganhos não habituais e aqueles que, mesmo recebidos com habitualidade, tivessem caráter indenizatório. A questão atinente à natureza da verba, inclusive seu caráter indenizatório ou não, para fins de incidência da contribuição previdenciária, seria matéria a implicar juízo de legalidade e de fatos e provas, inviável em sede de recurso extraordinário. Afirmou que deveria haver proporcionalidade entre as contribuições exigidas e o benefício concedido. Desse modo, o servidor deveria ser protegido de alterações abruptas do regime, mas não teria direito subjetivo a uma estrita vinculação do valor do benefício com as contribuições vertidas ao sistema da seguridade social. Ademais, a base econômica da contribuição previdenciária do servidor público não constaria do art. 40, § 3º, da CF, mas de seu art. 195, II, o qual dispõe sobre o financiamento da seguridade social para toda a sociedade. Assim, a base de cálculo das contribuições seria a folha de salários, o total dos rendimentos, a qualquer título. Entretanto, o art. 201, § 11, da CF estabelece que todos os ganhos habituais do trabalhador deveriam compor a base de cálculo das contribuições, a delimitar, para fins de incidência, o que seria considerado “total dos rendimentos”. Dessa perspectiva, no custeio da seguridade social, os princípios da solidariedade e da universalidade, conquanto não criassem poderes restritivos, já regulados por outras normas, teriam a função de delimitar os contornos do exercício dos poderes previstos nas regras constitucionais de competência. Em seguida, pediu vista dos autos a Ministra Cármen Lúcia.

Efeitos da declaração de inconstitucionalidade e ação rescisória

A decisão do Supremo Tribunal Federal que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou rescisão das decisões anteriores que tenham adotado entendimento diferente. Para que haja essa reforma ou rescisão, será indispensável a interposição do recurso próprio ou, se for o caso, a propositura da ação rescisória própria, nos termos do art. 485, V, do CPC, observado o respectivo prazo decadencial (CPC, art. 495). Com base nessa orientação, o Plenário negou provimento a recurso extraordinário em que discutida a eficácia temporal de decisão transitada em julgado fundada em norma superveniente declarada inconstitucional pelo STF. À época do trânsito em julgado da sentença havia preceito normativo segundo o qual, nos casos relativos a eventuais diferenças nos saldos do FGTS, não caberiam honorários advocatícios. Dois anos mais tarde, o STF declarara a inconstitucionalidade da verba que vedava honorários. Por isso, o autor da ação voltara a requerer a fixação dos honorários. Examinava-se, assim, se a declaração de inconstitucionalidade posterior teria reflexos automáticos sobre a sentença anterior transitada em julgado. A Corte asseverou que não se poderia confundir a eficácia normativa de uma sentença que declara a inconstitucionalidade — que retira do plano jurídico a norma com efeito “ex tunc” — com a eficácia executiva, ou seja, o efeito vinculante dessa decisão. O efeito vinculante não nasceria da inconstitucionalidade, mas do julgado que assim a declarasse. Desse modo, o efeito vinculante seria “pro futuro”, isto é, da decisão do Supremo para frente, não atingindo os atos passados, sobretudo a coisa julgada. Apontou que, quanto ao passado, seria indispensável a ação rescisória. Destacou que, em algumas hipóteses, ao declarar a inconstitucionalidade de norma, o STF modularia os efeitos para não atingir os processos julgados, em nome da segurança jurídica.

Fonte: STF